Como medir multidões – e por que há mais pessoas nos protestos do que se imagina
E o único instituto que fez as contas e, naturalmente, cuja estimativa mais repercutiu, foi o Datafolha: eles cravaram o número de manifestantes em 65 mil. Mas para quem foi – incluindo grande parte de nossa equipe – isso parecia pouco. E como a própria Folha admitiu nos dias seguintes, o número realmente subestimou o público total.
Mas quantas pessoas estiveram no protesto? E como é possível contar multidões nesse caso? O Giz explica.
65 mil? Só?
E onde foram contados os manifestantes? No Largo da Batata, na Faria Lima…? Isso também nunca ficou claro em nenhum texto da Folha. Na terça-feira, o Giz levou estas dúvidas ao diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, mas não obtivemos resposta. Na quarta-feira, procurado mais uma vez, Paulino não se posicionou.
Na Folha, o cuidado em usar o número variava. Às vezes, o jornal sugeria que este era o número total de manifestantes: “Enquanto 65 mil pessoas caminham pelas ruas de São Paulo protestando contra o aumento da tarifa de transporte público…”
Em outros momentos, dizia que este era o número mínimo de pessoas no protesto: “A manifestação que reuniu ao menos 65 mil pessoas em São Paulo pela redução da tarifa de ônibus…”
E, em um terceiro cenário, o jornal sugeria que apenas a concentração tinha 65 mil manifestantes:
E o Jornal Nacional, da Rede Globo, noticiou que ”em São Paulo, 65 mil pessoas, segundo o Instituto Datafolha, participam pacificamente de mais um protesto contra o aumento da tarifa do transporte público.”
A mídia internacional também usou o número, como a Reuters:
O número do Datafolha foi constantemente usado na cobertura do protesto, tanto pela própria Folha como por outros veículos nacionais e internacionais. Mas ele não foi exato, e nem passou perto disso. O Datafolha omitiu informações e, por fim, não fez o cálculo ideal. Trata-se de um erro grave, um número que acabou se propagando mas estava incorreto. E vamos explicar o motivo.
O que fazer? Chamar um terceiro, que não esteja diretamente envolvido nem com a polícia, nem com a organização do evento. Por exemplo, um órgão de universidade (como o Coppe/UFRJ) ou um instituto de estatística (como o Datafolha).
Há diversos métodos para se medir uma multidão. O mais conhecido foi criado por um professor universitário de jornalismo, Herbert Jacobs, nos anos 60 – e por isso é conhecido como “método de Jacobs”.
É simples: calcule a área do local, estime o número de pessoas por m², e multiplique os dois números. As pessoas se concentram de forma desigual? Então leve isso em conta. É isso que o Datafolha faz:
Havia quantas pessoas no protesto, afinal?
Em multidões comprimidas, [eles] contam cinco pessoas por metro quadrado. Quatro, se as pessoas se movimentam. Três, se o grupo está caminhando.
São 2,9 km de avenida entre os dois pontos, como é possível ver no Google Maps. E a avenida tem 40 m de largura. Ou seja, temos uma área estimada de 116.000 m² ocupada por manifestantes.
Multiplicando a área pela concentração de pessoas – entre 3 e 5 pessoas por m² – temos que a lotação máxima da área ocupada pelos manifestantes está entre 348 mil e 580 mil. Isso é muito mais do que a estimativa inicial da Folha, que considerava só a concentração inicial.
Robinson dos Santos, jornalista e formado em matemática na USP (Universidade de São Paulo), corrobora os cálculos, mas lembra a importância de haver pessoas na multidão para medir a concentração de pessoas:
No entanto, eles conseguiram dar uma estimativa em outra manifestação em São Paulo, no dia 20/06, durante a comemoração pela redução da tarifa de ônibus, de R$ 3,20 para R$ 3. Na sexta-feira, eis o que a Folha publicou:
Em manifestações, planejar algo do tipo é bem mais complicado: mesmo que haja um trajeto esperado, ele pode mudar – na segunda-feira, parte dos manifestantes foram pela Av. Rebouças, em vez de seguir pela Faria Lima. Sabendo dessas dificuldades, a Folha deveria ter tomado mais cuidado ao cravar um número que correu o mundo — e subestimou uma enorme movimentação popular.
Portanto, os protestos requerem uma técnica mais precisa de medição, o que falta em muitos lugares do país: nem em São Paulo tínhamos um instituto para estimar direito quantas pessoas ocupavam as ruas. Precisamos de mais envolvidos no cálculo de multidões, e de técnicas mais avançadas para tanto. Afinal, esta é uma das formas de deixar na História o peso e relevância das manifestações que tomaram o Brasil.
Giovanni Santa Rosa e Leo Martins colaboraram com a reportagem. Foto por Beraldo Leal/Flickr.
ATUALIZAÇÃO (23 de junho, 12h37): Suzana Singer, ombudsman da Folha, escreveu sobre os 65 mil de segunda-feira em sua coluna dominical, com o subtítulo “Eram mais de 65 mil”:
O cálculo de que havia 65 mil pessoas no protesto de segunda-feira em São Paulo provocou uma grita nas redes sociais. Quem esteve lá garante que passavam de 100 mil manifestantes.
O Datafolha, que fez a contagem, explica que essa estimativa era apenas do público que estava concentrado no largo da Batata antes de começar a passeata.
O instituto não conseguiu medir a manifestação em movimento, porque o percurso não foi definido com antecedência, como aconteceu com a Parada Gay ou a Marcha para Jesus. Não entra na conta dos 65 mil quem aderiu à marcha enquanto ela passava por diferentes pontos da cidade. Faltou à edição deixar isso claro.
Em meio a tantas incertezas, o Datafolha tem jogado luz sobre quem são esses manifestantes.
Fonte: GizmodoO Datafolha, que fez a contagem, explica que essa estimativa era apenas do público que estava concentrado no largo da Batata antes de começar a passeata.
O instituto não conseguiu medir a manifestação em movimento, porque o percurso não foi definido com antecedência, como aconteceu com a Parada Gay ou a Marcha para Jesus. Não entra na conta dos 65 mil quem aderiu à marcha enquanto ela passava por diferentes pontos da cidade. Faltou à edição deixar isso claro.
Em meio a tantas incertezas, o Datafolha tem jogado luz sobre quem são esses manifestantes.
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Como medir multidões – e por que há mais pessoas nos protestos do que se imagina
Reviewed by FABRICIOMALHEIROS96@GMAIL.COM
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junho 24, 2013
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